Combinação Linear, Dependência Linear e Base

Para estender o significado das operações e aplicações dos vetores, algumas das mais úteis ferramentas são justamente os conceitos de Combinação Linear, Dependência Linear e Base Vetorial.

Tais conceitos nos permitem descrever vetores como combinação de outros vetores, assim, podemos transformar coordenadas e espaços da maneira que nos for conveniente. Ao longo dessa aula, exploraremos tais conceitos.

Combinação Linear

Combinação Linear pode ser encarada como o vetor resultante da soma de determinado conjunto de vetores, sendo cada vetor do conjunto, ponderado por um coeficiente escalar.

Assim, podemos definir um vetor \(\overrightarrow{u}\) como sendo a combinação linear de \(n\) vetores \(\overrightarrow{v}\), multiplicados por \(n\) coeficientes \(a_{i}\):
\(\overrightarrow{u}=a_{1}\overrightarrow{v_{1}}+a_{2}\overrightarrow{v_{2}}+...+a_{n}\overrightarrow{v_{n}}\)
De maneira mais concisa:
\[\overrightarrow{u}=\sum_{i=1}^{n}a_{i}\overrightarrow{v_{i}}\]
Veja um exemplo para um caso específico no 3D:
\(\overrightarrow{v_{1}}=(1,2,3)\qquad \overrightarrow{v_{2}}=(5,0.5,9)\qquad \overrightarrow{v_{3}}=(0,7,4)\)
\(a_{1}=8\qquad a_{2}=4.4\qquad a_{3}=1\)
\(\overrightarrow{u}=a_{1}\overrightarrow{v_{1}}+a_{2}\overrightarrow{v_{2}}+a_{3}\overrightarrow{v_{3}}\)
\(\overrightarrow{u}=8(1,2,3)+4.4(5,0.5,9)+1(0,7,4)\)
\(\overrightarrow{u}=(8,16,24)+(22,2.2,39.6)+(0,7,4)=(30,25.2,67.6)\)
Assim como para a operação de soma, uma combinação linear também pode ser observada de forma geométrica.

Veja na simulação abaixo a representação geométrica de uma combinação linear de três vetores e altere os coeficientes \(a\), \(b\) e \(c\) para ver a alteração de seu resultado:
Perceba que uma combinação linear nada mais é então que a soma de um conjunto de vetores multiplicado por um conjunto de escalares.

Apenas por diversão, veja como ficaria uma combinação linear de 12 vetores aleatórios e bidimensionais onde seus coeficientes oscilam de maneira semelhante aos da representação anterior:
Você pode testar qualquer combinação linear possível para vetores 2D utilizando a ferramenta abaixo:

Base Vetorial

A partir da definição de combinação linear, pode-se perceber que é possível descrever vetores a partir de outros vetores. Essa é uma afirmação muito útil, pois ela nos permite cunhar uma definição vetorial para espaços geométricos, o que nos auxiliará a definir o conceito de "base".

Primeiro, imaginemos um plano cartesiano simples no 2D. Perceba que ao somar qualquer vetor desse plano com o ponto \((0,0)\), conseguimos um ponto (diferente de um vetor) com as mesmas coordenadas desse vetor no plano:
\(\overrightarrow{v}=(a,b)\)
\(P=(0,0)+(a,b)=(a,b)\)
Agora podemos utilizar esse artifício para transformar um vetor em um ponto.

Com isso em mãos, imaginemos também um conjunto de dois vetores não colineares (ou seja, possuem direções distintas). É possível encontrar qualquer outro vetor que também esteja no plano coordenado como combinação linear do conjunto dos dois vetores anteriores.

Aplicando o artifício de transformar um vetor em um ponto, podemos concluir que no plano cartesiano 2D, é também possível descrever qualquer ponto utilizando uma combinação linear de um conjunto de dois vetores.

Chamaremos de "base" esse conjunto de vetores. No caso atual, a denotaremos por \(\text{B}\), portanto:
\(\text{B}=\{\overrightarrow{u}, \overrightarrow{v}\}\)
Qualquer outro vetor do plano (assumindo que \(\overrightarrow{u}\) e \(\overrightarrow{v}\) não são colineares) pode ser descrito como uma combinação linear dessa base, assim:
\(\overrightarrow{w}=a\overrightarrow{u}+b\overrightarrow{v}\)
Transformando o vetor para um ponto, obtém-se sua descrição com a mesma combinação linear:
\(P=(0,0)+\overrightarrow{w}=a\overrightarrow{u}+b\overrightarrow{v}\)
Agora o ponto \(P\) possui duas coordenadas diferentes, uma em função do plano cartesiano, e outra em função da base \(\text{B}\):
\(P_{base\,cartesiana}=(au_{x}+bv_{x},au_{y}+bv_{y})\)
\(P_{base\,\text{B}}=(a,b)\)
Em que \(u_{x}\), \(u_{y}\), \(v_{x}\) e \(v_{y}\) são os componentes \(x\) e \(y\) dos vetores da base \(\text{B}\) no plano cartesiano.
Na simulação abaixo é possível ver claramente como funciona essa dinâmica, veja que o ponto disposto pode ser descrito como a soma dos vetores da base \(\{\overrightarrow{u}, \overrightarrow{v}\}\), e ao alterar o ponto, existirá outra combinação dos vetores da base que o satisfazem:
Note que ao modificar os vetores da base, os valores das coordenadas do ponto em relação à base se alteram.

Perceba também que quando as coordenadas dos vetores da base são iguais a \((1,0)\) e \((0,1)\), as coordenadas do ponto em relação à base são iguais às coordenadas cartesianas simples, assim, damos um nome especial a essa base. É a Base Canônica.

A Base Canônica é uma base ortonormal, que significa que todos os seus vetores possuem módulo igual a 1 e são ortogonais um ao outro.

Tal base é tão comum e útil, que seus vetores geralmente recebem um nome especial: \(\overrightarrow{i}\) e \(\overrightarrow{j}\). Se extendermos a base para o 3D, temos também o \(\overrightarrow{k}\).
\(\overrightarrow{i}=(1,0) \qquad \overrightarrow{j}=(0,1)\)
Ou no 3D:
\(\overrightarrow{i}=(1,0,0) \qquad \overrightarrow{j}=(0,1,0) \qquad \overrightarrow{k}=(0,0,1)\)
Uma maneira comum de descrever vetores é os referenciando como combinação linear da base canônica, por exemplo, veja como o vetor \((2,3,4)\) pode ser expresso em notação ijk:
\((2,3,4)=2\overrightarrow{i}+3\overrightarrow{j}+4\overrightarrow{k}\)
O nome "base" advém da sua propriedade de servir de base para formar qualquer ponto ou vetor que reside em determinado espaço, seja ele um ponto, reta, plano, espaço 3D, 4D, etc.

Agora observe novamente a simulação da base 2D, veja que quando alinhamos um vetor com o outro em uma mesma direção, a base não mais descreve o plano, mas sim uma reta.

Da mesma forma, se adicionarmos mais um vetor a essa base, deixando todos os vetores com direções diferentes, a área de cobertura não aumenta, bastavam dois vetores não colineares para cobrir o plano inteiro.

Isso significa que existe agora uma redundância dentro desse conjunto de vetores. Assim, ele não é mais uma base, pois se tornou linearmente dependente.

Finalmente, podemos definir uma base como: "Um conjunto linearmente independente de vetores que definem um certo espaço."

Vamos descobrir em mais detalhes o que significa tal "dependência linear".

Dependência Linear

Dizer que um vetor, quando adicionado a um conjunto de outros vetores, não aumenta o espaço gerado por eles, significa dizer que esse vetor pode ser descrito como uma combinação linear dos vetores do conjunto, assim, sua presença nele é redundante. A essa propriedade, damos o nome de dependência linear.
A simulação abaixo representa um conjunto de três vetores no plano bidimensional, perceba que eles representam um conjunto linearmente dependente.

É possível verificar isso claramente, pois abaixo do conjunto inicial, estão dispostas as três combinações lineares descrevem exatamente cada um dos vetores do conjunto.
Agora arraste um dos vetores para cima do outro, é possível perceber um fenômeno estranho: o tamanho dos lados do triângulo formado pela combinação linear do terceiro vetor (que não os dois colineares) começa a se aproximar do infinito.

Isso significa que o conjunto se aproxima de ser linearmente independente, pois esses dois vetores fariam apenas o papel de um, e não seria mais possível descrever o terceiro vetor como combinação linear deles.

Note, entretanto, que mesmo assim o conjunto permanece linearmente dependente, pois a regra é que pelo menos um vetor do conjunto seja combinação linear dos outros, e isso ainda vale para os vetores colineares, que ainda se descrevem como combinação linear um do outro.

Verificando a dependência linear de um conjunto

Agora que já sabemos como funciona a dependência linear, como verificar se determinado conjunto de vetores é linearmente dependente ou não?

Veja novamente na simulação, cada combinação linear forma um triângulo (ou polígonos diferentes para casos com números diferentes de vetores). O que significa que é possível percorrer esse polígono e chegar de volta ao ponto inicial, que seria o ponto \((0,0,...,0)\).

Note que definimos polígono, no escopo dessa aula, como uma figura formada por segmentos de reta.
Assim, podemos dizer que se o conjunto é linearmente dependente, esse polígono existe. Se não for possível encontrar nem um polígono fechado formado pela combinação linear desses vetores, o conjunto será linearmente independente.

Uma maneira de descobrir se esse polígono existe, é verificar se os únicos coeficientes da combinação linear que satisfaz a obtenção desse polígono são iguais a zero, isso faria que o polígono se colapsasse a um simples ponto (ou seja, não existe polígono fechado com tal conjunto), então o conjunto seria linearmente independente.

Essa é a intuição geométrica para desenvolver um método para avaliar dependência linear. Agora, como descrevê-lo matematicamente?

Podemos expressar isso matematicamente ao dizer que, se não é possível descrever nenhum vetor do conjunto como combinação linear dos outros, a solução para a equação entre a combinação linear dos vetores do conjunto e o vetor nulo é sempre nula (chamada de solução trivial):
\(\overrightarrow{0}=a_{1}\overrightarrow{v_{1}}+a_{2}\overrightarrow{v_{2}}+...+a_{n}\overrightarrow{v_{n}}\)
\((a_{1},a_{2},...,a_{n})=(0,0,...,0)\)
Caso a solução dessa equação não seja nula (um ou mais dos coeficientes \(a_{1},a_{2},...,a_{n}\) sendo diferente de 0), o conjunto é linearmente dependente, pois pelo menos um de seus vetores pode ser descrito como combinação linear dos outros.

Isso significa que quando o conjunto é linearmente dependente, é possível encontrar uma combinação linear (diferente da trivial) entre esses vetores que chega ao mesmo lugar, o ponto \((0,0,...,0)\), fechando assim o ciclo, caso contrário, o conjunto é linearmente independente.

Como resolver essa equação?

A equação da combinação linear existe na forma vetorial, então ela na verdade é um sistema de equações, assim, para resolvê-la, deve-se resolver tal sistema, podemos abri-lo da seguinte forma:
\(
\begin{pmatrix} 0 \\ 0 \\ \vdots \\ 0 \end{pmatrix}
=
a_{1}\begin{pmatrix} v_{11} \\ v_{12} \\ \vdots \\ v_{1m} \end{pmatrix}
+
a_{2}\begin{pmatrix} v_{21} \\ v_{22} \\ \vdots \\ v_{2m} \end{pmatrix}
+
\cdots
+
a_{n}\begin{pmatrix} v_{n1} \\ v_{n2} \\ \vdots \\ v_{nm} \end{pmatrix}
\)
Onde \(m\) é o número de dimensões dos vetores e \(n\) é o número de vetores do conjunto.

Multiplicando cada componente dos vetores pelos seus respectivos coeficientes:
\[
\begin{equation}
\left\{ \begin{aligned}
0 &= a_{1}v_{11}+a_{2}v_{21}+...+a_{n}v_{n1} \\
0 &= a_{1}v_{12}+a_{2}v_{22}+...+a_{n}v_{n2} \\
&\vdots \\
0 &= a_{1}v_{1m}+a_{2}v_{2m}+...+a_{n}v_{nm} \\
\end{aligned} \right.
\end{equation}
\]
Para encontrar os coeficientes \(a_{1},a_{2},...,a_{n}\) desse sistema, pode-se utilizar qualquer método de resolução de sistemas lineares. Sua solução pode representar:
Veja que, resolvendo esse sistema, conseguimos todas as informações que queríamos a respeito de dependência ou independência linear do conjunto.

Assim, definimos os conceitos de Combinação Linear, Dependência Linear e Base Vetorial, que tanto são importantes para o estudo da Geometria Analítica!

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